Vinte anos depois, a Ler Devagar ainda se lembra bem e se emociona com o que foi pensado em 1999, com os momentos públicos e íntimos que foi tendo, com as crises e deslumbramentos, com as mudanças que teve que fazer e os livros que acarretou às costas. Sempre a acarretar livros às costas — será feitio.
Talvez esteja naquela fase da vida em que já não se é jovem, mas também ainda não se vê a face do pai ao espelho.
Dez anos depois de abrir na LX Factory a Ler Devagar tornou-se, como se costuma dizer, uma loja-âncora. Neste complexo pós-industrial, também ele simbólico das transmutações importantes na cidade, vão-se criando e perdendo pêndulos entre juventude e maturidade.
A história da Ler Devagar está obviamente muito ligada à sua génese, aos seus momentos inaugurais; mas esta é uma história que tem e terá futuro, porque tem uma permanente sede — de beber, claro. Hoje sabe-se que dez anos de residência na LX Factory é um estatuto importante. É um momento em que a Ler Devagar se revê e se refunda – mas qb. A localização é um elemento facilitador para o novo êxito da livraria, certamente – mas esta não esquece que é produto de um passado e de um futuro. As pessoas vêm, os clientes mudam e variam, as propostas circulam; como os tempos e a geografia. Vejam-se alguns sinais dos tempos – o ano passado a editora que mais vendeu livros foi a Penguin — e não só para turistas, o que sucedeu foi a transformação da própria cidade. Entretanto a livraria tornou-se uma referência de nível mundial, o que, sendo obviamente lisonjeiro, acarreta riscos importantes. Sobretudo os mais ligados, justamente, à própria genética e capacidade de maturação. Veja-se o que sucedeu à Lello no Porto ou à Acqua Alta em Veneza; e a alteração radical da relação destas com os leitores, com as pessoas, com os locais. Não se quer nunca essa taxidermia. Vai continuar-se a ter sede. Vai continuar-se a ter uma capacidade de olhar e procurar responder aos tempos. Aos mundos e aos fundos. Com livros, com iniciativas culturais, com debates, com conferências. Talvez com mais livrarias. E com amigos, sempre.